Espionagem

Fábrica de Espiões: Rússia usou o Brasil para criar agentes infiltrados

Investigação do The New York Times revela que o país utilizou o Brasil como plataforma de lançamento para seus agentes de inteligência de elite desde os anos 1980

 

Segundo matéria do jornal The New York Times, a Rússia transformou o Brasil em uma linha de montagem para seus agentes secretos de elite, desde o final da década de 1980, quando o país ainda era parte da União Soviética e os espiões atuavam na KGB.

No Brasil, os russos encontraram facilidade para falsificação de documentos e atuar em outros países como brasileiros. Aqui, eles abandonaram suas identidades russas e se “tornaram” brasileiros, abrindo negócios e construindo relacionamentos, o que tornava seus disfarces ainda mais reais.

À época, não era necessário apresentar nenhuma documentação que comprovasse o nascimento de uma criança brasileira, bastando somente que os pais da criança fossem ao cartório e fizessem a declaração. Então, havia uma fragilidade no sistema que facilitava a fraude.

Nos últimos três anos, agentes de contrainteligência têm caçado esses espiões de forma silenciosa e metódica. Através de um trabalho policial meticuloso, agentes descobriram um padrão que lhes permitiu identificar os espiões, um por um.

Em abril de 2022, logo após as tropas russas entrarem na Ucrânia, a CIA passou uma mensagem urgente à Polícia Federal. Os americanos relataram que um oficial disfarçado do serviço de inteligência militar da Rússia havia aparecido na Holanda para fazer um estágio no Tribunal Penal Internacional de Haia — justamente quando este começou a investigar crimes de guerra russos na Ucrânia. 

Este oficial era Sergey Cherkasov, que se instalou em território nacional em 2010,adotando o nome de Victor Ferreira. Sergey chegou a viajar para Amsterdã, mas foi enviado de volta para o Brasil e foi preso pela Polícia Federal. Atualmente, ele é o único espião russo preso no Brasil.

Em um vídeo exibido pela matéria do Fantástico ontem (25), uma testemunha revelou que diplomatas russos participaram ativamente da chamada “fábrica de espiões”. A testemunha contou que teve contato com quatro cônsules, em depoimento dado no ano passado para agentes do FBI e da ABIN. 

A testemunha, que foi dona de uma agência de turismo entre 1999 e 2013, contou ainda que prestou serviços para o consulado da Rússia no Rio de Janeiro. A pedido dos russos, a testemunha mandou dinheiro para Sergey Cherkasov, que na época estudava na Irlanda com passaporte brasileiro. Um desses valores foi de R$ 40 mil.

A partir do caso de Sergey, a operação russa no Brasil começou a ser desmantelada. Além de Sergey, agentes descobriram pelo menos mais oito policiais russos operando sob identidades brasileiras, de acordo com documentos e entrevistas. Seis nunca foram identificados publicamente até agora. A investigação já abrangeu pelo menos oito países, com informações vindas dos Estados Unidos, Israel, Holanda, Uruguai e outros serviços de segurança ocidentais.

Ainda segundo a reportagem do The New York Times, mais alguns nomes foram identificados. Artem Shmyrev, sob a identidade de Gerhard Daniel Campos Wittich, era dono de uma empresa de impressão 3D no Rio. Ele fugiu do país há três anos. Outro agente, que dizia ser joalheiro e usava o nome de Eric Lopes, seria na verdade Aleksandr Andreyevich Utekhin. Quando a PF chegou em uma loja dele em São Paulo há dois anos, ele já havia desaparecido.

Um casal de russos que usava os nomes Manuel Francisco e Adriana Carolina Pereira morou no Brasil até 2018. Manuel Francisco é na verdade Vladimir Danilov e Adriana se chama Yekaterina Danilova. Os dois se mudaram para Portugal antes de a polícia chegar até eles. Os dois também estão desaparecidos. 

Uma russa que usava o nome Maria Luisa Dominguez Cardozo teve como último destino conhecido a Namíbia. Ela tinha documentos brasileiros. O nome dela ainda não foi revelado pelas autoridades. Outros três agentes russos, cujos nomes brasileiros não foram revelados, deixaram o país rumo ao Uruguai. As embaixadas da Rússia e dos Estados Unidos e a Polícia Federal não comentaram o caso.

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