Várias organizações e movimentos sociais e ambientais se mobilizaram neste domingo (1º) em diversas cidades do Brasil para protestar contra o Projeto de Lei 2159/2021, apelidado de “PL da Devastação”. Em São Paulo, a manifestação aconteceu na Avenida Paulista e contou com o apoio de 80 organizações.
Essa PL cria um novo marco para o licenciamento ambiental no Brasil e já foi aprovada pelo Senado, com 54 votos a favor e 13 contra. Como o texto sofreu alterações, ele agora vai voltar para a Câmara dos Deputados, onde será reavaliado.
Entre as mudanças, o texto aprovado no Senado libera do licenciamento ambiental as atividades consideradas sem risco ao meio ambiente, além daquelas que precisem ser realizadas por motivos de soberania nacional ou em situações de calamidade pública.
O projeto também isenta de licenciamento empreendimentos agropecuários voltados para o cultivo de espécies de interesse agrícola, além da pecuária extensiva, semi-intensiva e intensiva de pequeno porte.
Ambientalistas consideram a proposta um dos maiores retrocessos ambientais da história recente do país. O governo federal também critica o projeto, o classificando como um desmonte do sistema de licenciamento ambiental no Brasil.
"O governo tem uma série de dificuldades em relação a uma base segura de sustentação. E isso varia para cada tema. Não é a primeira vez que a gente sofre alguma dessas derrotas, inclusive em agendas que são igualmente estratégicas, mas vamos continuar dialogando o tempo todo com o Congresso", disse a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva
Apesar das críticas, a relatora do projeto, senadora Tereza Cristina (PP-MS), defendeu que a proposta busca tornar o licenciamento de obras no país mais claro, eficiente e justo. De acordo com ela, o marco regulatório atual, com regras sobrepostas, acaba travando iniciativas importantes e desestimulando investimentos responsáveis.
As manifestações deste domingo têm como principal objetivo pressionar os deputados a rejeitarem a PL, apelidado também de “mãe de todas as boiadas”. A expressão faz referência à fala do ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, durante o governo Jair Bolsonaro, quando defendeu "passar a boiada" nas regras ambientais enquanto o país focava na pandemia do covid-19.
Além dos protestos em diversas cidades do país, as organizações criaram o site “PL da Devastação” para mobilizar a população e pressionar o Congresso a não aprovar o projeto. Para o arquiteto urbanista, ativista e porta-voz da Rede Sustentabilidade em São Paulo, Marco Martins, o projeto desestrutura completamente o sistema de licenciamento ambiental no Brasil.
De acordo com Marco Martins, o projeto de lei compromete as ações de combate ao desmatamento e o cumprimento das metas ambientais assumidas pelo Brasil nas Conferências das Partes (COPs). “Reduzimos o desmatamento em mais de 42% no ano passado, mas esse PL inviabiliza completamente esse avanço, além de prejudicar as metas do Brasil, as chamadas NDCs (Contribuição Nacionalmente Determinada)”, afirmou. Ele acrescentou ainda que o afrouxamento das regras ambientais pode inviabilizar o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia.
Os manifestantes alertam que os povos originários estão entre os mais prejudicados pelo projeto de lei. Werá Mirim, do povo Guarani Mbyá, afirmou que a proposta em debate no Congresso pode trazer impactos graves. “Vai causar muitos impactos não só para os povos originários, mas para todos que lutam pela causa e que protegem a natureza e os animais”, destacou.
O protesto em São Paulo reuniu ativistas como o Ivan Munz, que participou com um triciclo customizado com mensagens contra os maus-tratos a animais e a chamada “PL da Devastação”. “Quanto mais boi, maior será o desmatamento e também os efeitos das mudanças climáticas”, afirmou Munz, fazendo referência à expansão da pecuária como motor do desmatamento.
Durante o protesto, os manifestantes também prestaram solidariedade à ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que foi alvo de agressões verbais por senadores durante uma audiência na Comissão de Infraestrutura do Senado. Para os participantes, o episódio foi um desrespeito não apenas à ministra e à sua trajetória, mas também às instituições democráticas e às políticas ambientais do país. “Estamos aqui em defesa da ministra, dos órgãos de licenciamento e das instituições que vêm sendo atacadas por congressistas, como o Ibama e o ICMBio”, afirmou o manifestante Martins.
Na semana passada, a organização Oxfam Brasil fez um alerta sobre a possível aprovação de um Projeto de Lei que muda as regras do licenciamento ambiental no país. Segundo a entidade, a proposta representa um “grave retrocesso”, pois enfraquece a participação da sociedade no processo e ameaça os direitos de povos indígenas, comunidades tradicionais e populações em situação de vulnerabilidade.
“A flexibilização ignora as desigualdades estruturais do Brasil e favorece a expulsão de comunidades de seus territórios para dar lugar a empreendimentos predatórios. Isso significa mais deslocamentos climáticos, mais insegurança alimentar e menos condições de vida digna para os mais pobres. Enquanto grandes empreendimentos lucram, são as comunidades negras, indígenas e periféricas que ficam com a lama, a fumaça e a falta d’água".
Ela também ressaltou que um licenciamento ambiental enfraquecido afeta diretamente as populações mais vulneráveis. “As principais vítimas já têm cor, CEP e nome”, afirmou a organização, destacando a importância de políticas que protejam tanto o meio ambiente quanto as pessoas. Para a entidade, é fundamental combater o racismo ambiental e garantir que comunidades tradicionais possam viver com dignidade em seus territórios. “Licenciamento ambiental não é obstáculo, é proteção. É um direito”, concluiu.
Com informações Agência Brasil.